A mula
originalmente postado em 19/04/2020“they say the road gets rough and you get lost when you’re led by blind faith/ but we might just get away with it/ religion’s in your lips/ even if it’s a false god/ we’d still worship this love”
— false god, taylor swift
Camila normalmente era mais paranoica. Tendo uma família como a dela, era de se esperar que de ser exposta ao oculto desde pequena Camila já estivesse acostumada com tudo que o mundo poderia mostrar. Ela sabia que quando ouvia barulhos lá fora quase toda madrugada de quinta-feira e via seu irmão fugindo pela janela, ele não estava sendo um adolescente rebelde e fugindo para festas e para causar problemas. Sabia que quando via mechas loiras no fundo do espelho do banheiro ela deveria sair dali, e não esperar que fosse uma outra pessoa entrando. Sabia que o mundo era muito mais complicado do que a maioria das pessoas achava, e sabia de todos os perigos e coisas impossíveis que espreitavam na esquina — mas a verdade é que a sabedoria é o maior catalisador do medo. Então, normalmente, Camila era mais paranoica que isso. Talvez se ela soubesse o que realmente iria acontecer ao longo daquele dia, ela não estivesse tão calma.
Apesar disso, naquela noite, quando a coruja passou por cima de sua casa alertando todos dentro dela com seu aterrorizante ruído de pano sendo rasgado, Camila ficou calma. Ela rezou, antes que adormecesse, pelo bem de sua família, e no fundo de sua consciência rezava para que o sinal do pássaro fosse para ela. Anos de paranoia e de incerteza em relação aos perigos sobrenaturais que a seguiam fizeram com que o aviso prévio da rasga mortalha a tranquilizasse. Está chegando, ela pensava. Está chegando para mim e eu estou preparada.
Ninguém tocou no assunto no outro dia de manhã, apesar de todos sem dúvidas terem ouvido os gritos da coruja passando por cima do telhado da casa. As refeições normalmente eram mais barulhentas. Nove cadeiras contornavam a mesa de madeira e, diferente de todos os cafés da manhã prévios que já tinha compartilhado com seus seis irmãos, todos estavam calados. Ninguém brigava com ninguém. Suas irmãs não discutiam entre si sobre quem pegou o que de quem, de quem era a roupa que uma estava usando, quem comeu o resto do cereal, e seu irmão não reclamava de todas elas, não debochava de ninguém. Sua mãe não pedia para ninguém fazer as pazes, seu pai não mandava ninguém fazer silêncio. Era um café da manhã diferente de todos os outros, e a família inteira sentava, calada, comendo em silêncio seu pão. Ninguém ousaria falar o que todos estavam pensando — que algum deles morreria logo, logo. Mais tragédia cairia sobre eles, e tudo que lhes restava era esperar para ver.
Camila acabou de comer e saiu de casa com a desculpa de que se encontraria com amigas naquela manhã. Ela andou até a praça, sentou num banco e esperou, junto aos pombos, como havia feito a semana inteira. Eriberto chegou poucos minutos depois.
“Bom dia,” o homem disse, sorrindo ao vê-la, e sentou-se ao seu lado. Seus olhos eram tão brilhantes quanto sempre, seu sorriso branco e suas profundas covinhas esculpindo o belo rosto que Camila tanto gostava.
“Bom dia, senhor” Camila respondeu sorrindo de volta ao homem, que pegou sua mão e a segurou. Camila olhou para ele surpresa.
“Minha bela,” ele disse, “eu já esperei demais. Cada minuto que passo com você que não estou te tocando, te amando, é tortura.” as bochechas de Camila ficaram rosadas. Ela havia saído com o homem por uma semana, depois de conhecê-lo brevemente numa festa e tê-lo chamado atenção. Todo dia, na praça de São Marcos, Camila e Eriberto passavam horas conversando, e ambos pareciam gostar mais um do outro a cada hora que passava.
“Não espere mais,” ela disse, olhando-o nos olhos. “Na verdade, espere sim. Só mais algumas horas. Me encontre hoje a noite.”
“Encontrarei!” ele disse. “encontrarei, mas peço que fuja comigo. Fuja comigo para que eu possa fazer de ti minha noiva.”
Os olhos da menina brilhavam. “E porque temos que fugir? Por que nao casas comigo aqui?”
“Tenho tudo a perder aqui, Camila.” ele disse, uma expressão triste em seu rosto. “Mas perderia tudo por você. Perderia tudo facilmente, se você me prometer que me ajudará a deixar tudo para trás, e que fugirá comigo.”
Ela acenou para cima e para baixo com a cabeça. “Fugirei. Me encontre mais tarde, depois que sol se pôr, aqui mesmo em nosso banco.”
“E porque não fugir agora?” ele perguntou, empolgado.
“Se hei de deixar coisas para trás, tenho que despedir-me delas. Dê-me tempo.”
Ela voltou para casa e pensou se o presságio da rasga mortalha não se referia ao ato que planejava fazer naquela noite. Se sua fuga, seu desaparecimento, não seria visto como uma morte para sua família. E se não fosse, Camila imaginou que o destino estava andando de mãos dadas com ela. Se a morte viesse para uma de suas irmãs, para seu irmão ou sua mãe ou seu pai, ela não estaria aqui para ver, e, longe de todos, seu luto generalizado de deixá-los para trás seria o bastante. A ignorância é uma dádiva, eles diziam, e ela estava cansada de ser tomada pela paranoia. No caminho para casa, Camila fantasiou mil cenários de amor. Era como nos livros, ela pensava. Desistir de tudo por seu amor verdadeiro, que era tudo que importava nessa vida, fugir, viver algo novo. Ela estava completamente tomada pela paixão.
As horas que passou quando chegou em casa deitada em sua cama pensando em Eriberto e na vida nova que levariam deveria ter sido emoldurada, congelada no tempo, para que Camila pudesse viver eternamente nelas, sem nunca ter que vivenciar as horas que seguiriam. Ela leu mais romances, e ajudou sua mãe com o almoço, completamente distraída por seus pensamentos e fantasias. Ela colocou seus melhores vestidos num saco e escondeu o saco debaixo da cama, para que quando desse a hora ela os levasse consigo. Tricotou uma blusa, para si mesma e para seu amor, para que não passassem frio no caminho. Pensou em escrever uma carta, dando adeus à família, mas imaginou que talvez fosse melhor se pensassem que havia morrido — se pensassem que a rasga mortalha era sobre ela, que um monstro, uma alma, uma bruxa havia a levado para longe.
E então eram 4 e meia da tarde, e sua mãe a chamou.
“Está bonita?” ela perguntou, entrando em seu quarto.
“Bonita?” Camila perguntou.
“Estamos de saída.”
“Para aonde?”
“Para a missa.” Por mais religiosa que dona Maura fosse, ela raramente obrigava os filhos a irem para a igreja. Os símbolos e ícones espalhados pela casa e a reza antes das refeições e de dormir pareciam ser o bastante para que sentisse seus filhos abençoados, além de sempre manter água benta por perto. Hoje seria diferente.
“Realmente tenho que ir?” Camila temia que aquilo atrapalhasse seus planos com Eriberto.
“Hoje sim.” sua mãe olhou para ela, e então saiu do quarto. A rasga mortalha havia aterrorizado todos naquela casa, e Maura queria, pela última vez, rezar ao lado de todos os seus filhos e seu marido. Deus sabe qual deles estaria faltando da próxima vez.
Camila colocou um simples vestido cor de pérola. Não era um dos seus mais bonitos, visto que esses já estavam guardados na sacola, que ela apanhou, e, de fininho pela porta de trás da casa, escondeu atrás de um arbusto, por precaução — talvez fosse necessário que, após a missa, tivesse que correr, pegar suas coisas, e se encontrar com seu futuro noivo. Ela estaria preparada. Todos a esperavam na sala, surpreendentemente arrumados — suas 5 irmãs com seus vestidos feito à mão, bonitos e contornando o belo corpo de cada uma, sua mãe, com o vestido verde que haviam a dado de presente em seu último aniversário — precedido de uma onda de trabalhos de bordado de todas as suas filhas, que haviam vendido diversos vestidos para conseguirem, juntas, o dinheiro para o presente — seu pai, por um momento raro, sem suas roupas sujas do trabalho, mas com uma camisa branca e limpa, e até seu irmão — jovem e rebelde Anderson, com seus meros 14 anos, vestindo uma justa gravata azul. Ele claramente estava odiando tudo aquilo.
Vendo toda a sua família preparada para adentrar ao templo de Deus por uma última vez, Camila sentiu uma pontada de medo — medo de deixá-los, medo de decepcioná-los, medo de sentir saudade. Mas o amor romântico, ah, o amor romântico atravessaria cada fronteira e a faria uma mulher feliz. Talvez, no futuro, ela os visitasse em sigilo, com seu marido e seus filhos, e os pediria perdão.
A família saiu e andou em direção a igreja, onde, às 17h, a missa começaria. A comunidade inteira estava lá — sempre estavam. Os nove sentaram juntos em um banco na pequena capela e esperaram o evento começar.
Deu-se início ao canto e o padre entrou no altar, e quando Camila tirou seus olhos do seus irmãos e olhou para cima, viu no padre seus olhos preferidos, as covinhas e o sorriso por qual havia se apaixonado. Fazendo o sinal da cruz e depositando um beijo no altar, para Cristo, estava o seu Eriberto, e vidrada e chocada, sem saber o que pensar, Camila falou “Amém” junto a todos.
Era isso que ele estava escondendo, Camila pensou. Estava escondendo sua vida real de mim, mas por mim estava disposto a deixá-la para trás. Não conseguiu prestar atenção em momento algum da missa, só tinha seus olhos vidrados no homem comandando a oração e sua mente imaginando todas as coisas que poderia dizer para ele quando acabasse — pois assim que acabasse, iria falar com ele. Iria pedir respostas, iria confrontá-lo e iria fugir com ele, deixando missas e pecados para trás, de uma vez por todas. A canção final terminou e o padre saiu do altar.
“Acho que vi uma amiga minha lá na frente,” Camila disse, enquanto sua família se dirigia para fora da igreja, “me encontro com vocês já, já, certo?” e ela seguiu, com a igreja quase vazia, para a porta na lateral do altar, onde encontraria o seu grande amor. Ela bateu na porta e segundos depois ela se abriu, Eriberto do outro lado.
“Como posso aju-” ele começou a dizer e então viu o rosto de Camila. “Oi,” ele disse, quase que suspirando, surpreso com a presença da menina ali. Camila entrou na sala e ele fechou a porta.
“Então é isso que você quer deixar para trás,” ela disse, um tom um pouco triste em sua voz.
“Desculpe não ter te dito antes,” ele disse, e ambos estavam de frente um para o outro, em pé naquela sala. “Mas se eu te contasse… Eu tenho medo que você não ficaria comigo. Que não aceitaria o meu amor, por causa do que sou. Mas eu te amo, Camila.”
“Me ama mais o que ama Deus?” ela provocou.
“Ninguém deve amar ninguém mais do que Deus. Mas quero te servir mais do que quero servir a Deus.”
“E tem certeza que quer deixar isso para trás? Todo seu trabalho, sua devoção, por mim?” ela perguntava preocupada, mas por dentro sabia que só perguntava por validação, para ouvi-lo dizer que ela era maior que tudo aquilo, que ela era mais importante, que ela era a devoção dele. E foi o que ele disse, entre beijos e carícias debaixo do teto da igreja.
“Vamos,” Camila quebrou o milésimo beijo e olhou Eriberto nos olhos. “Agora, vamos fugir.”
“Sua família não está te esperando?”
“A esse ponto eles já devem ter ido para casa. Eles sabem como eu posso passar horas conversando com minhas amigas.”
“Eles devem estar lá fora, Camila. Fale com eles, e me encontre aqui depois.” ele beijou a testa da menina e Camila saiu, encontrando com sua família na porta da igreja, voltando com eles para casa. Pela última vez, os 7 irmãos caminhavam juntos, sempre debaixo de uma nuvem de maldições, sempre prestando atenção nas criaturas a espreita. Sua condição financeira não era das melhores, sua casa era sempre uma bagunça, fruto de 7 jovens andando por ela, e sua exposição ao oculto — desde cedo, desde o inicio, desde a infância de Maura, desde a maldição de Anderson, desde as histórias que seu pai contava antes de dormir de bruxas e monstros esperando na janela para pegarem crianças malcriadas. Camila deveria saber exatamente o que a esperava naquela noite de quinta-feira, mas ela estava distraída, e a distração é a maior inimiga do cuidado — cuidado esse que anda de mãos dadas com a paranoia. Mas Camila estava tranquila.
Ela chegou em casa, apanhou a bolsa com roupas e todo o dinheiro que havia conseguido costurando vestidos que ainda não tinha gastado, deu uma desculpa aos pais e andou em direção a capela, sem olhar para trás uma única vez, com medo de se arrepender. O sol já havia se posto e as luzes a gás iluminavam as ruas escuras. Camila seguiu até a igreja e quando chegou lá, levemente empurrou a porta fechada de madeira. Eriberto havia deixado-a aberta para ela.
O homem a esperava na frente do altar, e Camila correu para abraçá-lo.
“O cavalo está lá atrás. Temos que nos apressar. Será difícil fazer a viagem no meio do breu.”
“Sim, sim,” ela respondeu, soltando o abraço, e então olhou para o pequeno confessionário ao lado deles. “Só uma coisa.” e então seguiu para a cabine, levando Eriberto junto pelo braço.
“Vai se confessar?” ele perguntou, entrando no compartimento reservado para o padre.
“Brevemente,” ela disse sorrindo, e em vez de sentar no compartimento do confessante, ela se ajoelhou na frente dele.
“Abençoe-me, Padre,” ela disse, levantando a cabeça por um segundo para ver sua reação — ambos riam. “Pois estou prestes a pecar.”
Uma hora depois, Camila e Eriberto saíram pela porta de trás da igreja e o cavalo de Eriberto os esperava, carregando os pertences do homem. Eles subiram no animal e, a noite escura os acompanhando, galoparam em frente, para longe daquela cidade, longe da igreja, longe da vida antiga que deixavam para trás. A lua ficava cada vez mais alta no céu o mais longe que iam. De onde estavam, só se podia ver pequenos brilhos de luz da cidade, todas as casas já tinham saído de suas vistas. Na sua frente, quilômetros de campo se estendiam iluminados pela luz da lua, e não tão longe, indícios de um pequeno vilarejo começavam a aparecer.
“Talvez paremos lá”, Eriberto havia dito para Camila quando começaram a chegar perto, o volume de sua voz batalhando contra o barulho do vento que os rodeava. “Para que não fiquemos viajando a noite toda.” Camila concordou. Ela não disse em voz alta, mas temia muito essa viagem no meio de uma noite de quinta feira. Deus sabia os perigos que sofriam, os amaldiçoados saindo pela madrugada em busca de tragédia. Quando chegaram ao povoado, desceram do cavalo e foram, os três, andar em busca de alojamento. Eriberto tinha uma pequena quantidade de dinheiro guardada, e Camila tinha um pouco menos, dos trabalhos que havia feito previamente. Eles planejavam trabalhar quando se estabilizassem em algum lugar, guardando dinheiro o suficiente para terem um bebê. A verdade é que Camila não entendia muito de dinheiro, além do pequeno trabalho que fazia costurando vestidos, e tudo que fazia era dar parte do que conseguia para seus pais, para que cuidassem da casa e das refeições. Eriberto havia crescido confortavelmente, e sua vida na Igreja o isentava de passar por dificuldades maiores. O casal não sabia exatamente o que os esperava.
Avistaram uma hospedaria logo em frente e foram andando até ela. O cavalo os seguia, puxado por uma corda na mão de Eriberto, e ao redor deles tudo estava quase vazio — a hora da noite mandava todos para dentro de casa.
Camila parou no meio do caminho, e Eriberto olhou para ela, confuso.
“Vamos, Camila.” mas a mulher continuava parada no lugar, uma expressão de dor em seu rosto, sua boca levemente se abrindo, como se para pedir ajuda ou gritar de dor, mas nenhum som saia.
“Camila?” ele se aproximou dela, assustado. Ela se contorcia, arquejando e caindo ao chão, um rouco grito tentando sair de sua boca, lágrimas de dor caindo de seus olhos. Eriberto se agachou ao seu lado.
“Camila, o que está acontecendo?” a menina não respondia, apenas se contorcia de dor. “Fale comigo” Eriberto pedia, desesperado. E então ela o empurrou. Ele caiu longe dela, assustando o cavalo e o levando a relinchar alto, e Eriberto a observou com medo. Sua contorção não parecia mais de dor, e sim um diferente movimento de membros, como se estivesse se transformando em outra coisa.
Os gritos de Eriberto e do cavalo e o frenético movimento na rua acabaram levando alguns moradores curiosos para fora de suas casas ou suas cabeças para fora de suas janelas, e o povoado observava, confusos e com medo, enquanto uma onda repentina de fogo tomou conta do corpo de Camila, e o que antes eram braços e pernas e dedos subitamente se transformaram em patas, cascos, um longo tronco, e uma assustadora mula relinchava violentamente onde alguns segundos atrás o corpo de Camila estava.
O povoado gritava, e Eriberto subiu em seu cavalo e tentou fugir dali. Homens saiam de suas casas, com espingardas, tochas e forquilhas, correndo em direção a mula e atirando contra ela, gritando e xingando-a, e a mula correu dos ataques, correu em direção às igrejas, correu pela noite, seguida de seu amor em cima de seu cavalo, junto a todos os outros homens que a seguiam com armas e atiravam contra ela, tentando matá-la.
A família de Camila não era ignorante. Sua mãe e seu pai contavam histórias das criaturas que viviam nas redondezas desde sempre, como se contassem simples fatos, e não histórias de terror. Eles nunca trataram aquilo como mitos, pois sabiam muito bem que aquilo não era impossível — e crescer daquele modo fazia com que Camila e todos os seus irmãos tivessem os olhos bem abertos para o que se escondia atrás do óbvio, soubessem bem o que fazer em momentos de perigo, não se assustassem com todas as maldições que haviam os atingido ao longo do tempo. Sua mãe fazia leituras de tarot, sua irmã Cecília havia acidentalmente vendido sua alma pela magia anos atrás, seu irmão, sétimo filho, frequentemente se transformava numa besta nas madrugadas, e ela, agora, corria quilômetros em velocidades impossíveis para fugir daqueles homens, para sofrer sua maldição. A perseguição durou horas, e a mula corria dos tiros incessavelmente.
O primeiro cantar do galo veio, e resquícios do sol começaram a pintar o céu de laranja. A mula ficava cada vez mais fraca. Ela já havia percorrido igrejas, dado voltas em vilarejos, e os homens não desistiam de matá-la. O segundo canto veio, e os homens a alcançavam, suas flechas e balas a atingindo mas não fazendo muito estrago. Ela era forte.
O galo cantou pela terceira vez, o céu estava praticamente azul, e sua forma animalesca lentamente se desfazia. Os homens estavam longe, chegando cada vez mais perto, a fumaça de seu fogo, que já se apagara, dando lugar para sua cabeça e seus olhos castanhos e seu cabelo preto, a rodeava, pintava seu caminho de cinza, e ali, sentada, nua e indefesa, seus braços e mãos e pernas de volta, balas a atingiram incessavelmente, tocando em velocidade seu pequeno corpo indefeso, perfurando seu peito e seu estômago e sua cabeça.
Essa não era uma história de amor.