A estátua

originalmente postado em 26/04/2020

the sights were as stark as my baby/ and the cold cut as sharp as my baby/ and the nights were as dark as my baby/ half as beautiful too

— as it was, hozier

Suponho que queria me perguntar como eu fiz isso. A verdade é que não sei. Em um momento meus dedos tocavam puro mármore, o rosto sólido de minha escultura. Tive que vender diversos quadros e outras estátuas — peças que eram importantes para mim — e até roubar alguns bolsos no meio da feira para que pudesse conseguir esse tanto de mármore e pudesse trabalhar nele sem me preocupar intensamente em gastos. Valeu a pena desapegar tanto de obras queridas quanto da legalidade, pois alguns meses depois aqui estava minha escultura, e era um dos melhores trabalhos que eu já havia feito. Depois que a terminei, várias semanas atrás, não consegui seguir em frente para outro trabalho. Meus olhos estavam vidrados na escultura. Para não ficar apenas perdendo tempo observando-a, passei a mexer em pequenos detalhes, tentar aperfeiçoá-la — apesar de, modéstia a parte, ela já estar perfeita. Seus cabelos de pedra caiam como se fossem seda por cima de seus ombros, e o pano de sua roupa, cobrindo-a até os pés, era quase que natural. Ela era do meu tamanho, talvez um pouco menor, a não ser por suas asas. Eu havia esculpido pena por pena, cada detalhe da asa do anjo que se estendia nas costas da minha escultura, e tive que subir num banco, nas pontas dos meus pés, para esculpir o ponto mais alto. Eram asas gigantes, as do anjo que eu havia construído. Sem falar no seu rosto — seus olhos não tinham pupilas mas mesmo assim sentia como se estivesse olhando diretamente para mim. Seu nariz era grande, a curvatura um pouco quebrada, mas não era erro meu. Estava exatamente como eu queria. Eu havia esculpido sua boca em um leve sorriso e seus braços numa posição como se quisessem segurar a minha mão — me chamando, tentando me alcançar.

Eu havia me apaixonado pela imagem de minha própria escultura, e mais uma vez eu me encontrava a encarando. Em um momento, meus dedos tocavam puro mármore, e de repente, o sólido toque que eu sentia se tornou quente e macio, e o rosto que eu tocava era feito de carne, pura pele humana. Eu retirei minha mão num susto, e a criatura olhava para mim, irises castanhas que não estavam lá antes colorindo seus olhos — abertos, assustados. Não sei te dizer o que aconteceu. Se minhas preces haviam sido tão altas e tão fortes eu não havia percebido, mas Apollo atendeu um pedido que eu nem mesmo havia entendido que estava pedindo. Ele é esperto, entretanto. Ele entendeu bem.

O anjo descia de seu pedestal e suas asas, agora se mexendo, tomavam conta de quase que o meu estúdio inteiro — o que não era muito difícil, visto o tamanho do local. O vento que entrava pela janela bagunçava levemente seus cabelos longos, e o anjo olhava confuso para mim. Eu não consegui me mover, olhando aquela criatura perfeita se movendo, e então fiquei parada quando sua mão — antes de pedra, agora carne e osso — se estendeu e tocou o meu próprio rosto. O anjo chegou mais perto de mim e nossos rostos estavam a centímetros de distância. Por um momento, pensei que poderia beijá-la.

“Você é real?” perguntei, e o anjo observava minha boca enquanto eu falava, como se aprendendo a mobilidade dos meus lábios. Ele abriu a boca, testando o movimento, e então disse.

“Sim.” a criatura olhou ao redor do estúdio e andou em direção a janela — o sol estava a caminho de se pôr e as pessoas andavam de um lado para o outro nas ruas de Florença. Eu me aproximei da criatura e juntas observamos o exterior.

“Qual seu nome?” perguntei para o anjo. De todas as perguntas que poderia fazer para descobrir que tipo de milagre havia feito com que meu anjo de pedra virasse tão real quanto eu mesma, essa foi a que fiz. A criatura olhou para mim confusa.

“Meu criador não me deu”

“Seu criador?”

Ela se virou da janela e olhou para o estúdio. Seus olhos focaram no pedestal de onde havia saído, onde eu havia a construído, e todos os materiais de escultura e pintura ao seu redor. Então ela olhou para mim.

“Você.”

Abri minha boca num pequeno “oh” e então a escultura viva virou novamente seu corpo para a janela, maravilhada com o céu e com as pessoas lá embaixo.

“Erika,” eu disse, e ela olhou para mim. “Seu nome.”

Ela sorriu, feliz de ter um nome. “Quer comer alguma coisa?” perguntei, sem saber mesmo se ela era capaz de sentir fome. Eu tinha alguns pães guardados, então coloquei-os em uma cumbuca e sentamos juntas no chão do estúdio.

“Como você… ficou… assim?” disse, após engolir um pedaço de pão. Não sabia bem o que perguntar para entender aquela situação.

“Assim?” Erika perguntou, enquanto mastigava.

“Você era uma escultura” disse.

“Mas você desejou que eu fosse algo além,” ela disse num tom quase de pergunta, como se fosse óbvio, mas agora não tivesse mais certeza.

“E quem ouviu minhas preces?”

Erika parecia um pouco irritada. “Não sei, não sei.” e então comeu mais pães.

Durante a noite inteira ela me fez perguntas sobre o estúdio, os materiais de pintura, as pessoas lá fora, a praça logo em frente. Respondi todas com um brilho nos olhos, meu coração se apertando toda vez que ela gostava de uma resposta, toda vez que se interessava pelos pequenos fatores que construíam a minha vida, a minha morada, a minha cidade. A lua era a única coisa que iluminava o recinto quando deitamos juntas no pequeno colchão no canto do estúdio, que era a única coisa que indicava que aquele lugar era mais que um local de trabalho, mas sim a minha casa. Estávamos viradas uma para a outra, e as asas de Erika se esticavam para fora do colchão.

“Posso ir com você amanhã?” ela me perguntou, prestes a adormecer.

“Para onde?”

“Vender quadros. Na praça.” Erika disse, e eu suspirei.

“Não acho que seja possível. Suas asas chamarão atenção” disse.

A expressão mais triste do mundo estampou seu rosto.

“Mas não é divertido vender quadros,” tentei salvar a situação. “O sol é quente demais e minhas pernas cansam tanto, tanto. As pessoas são rudes…” vi que nao adiantava. Erika estava triste demais por eu a ter negado isso, mas eu não poderia deixar que ela saísse por aí assim. Ou diriam que ela era fruto de bruxaria, que eu era uma bruxa, ou que ela era um anjo de verdade — o que eu mesma não sei a veracidade — e a tirariam de mim, a levariam para a Igreja, onde pudesse ser explorada e mostrada ao mundo, um milagre, um ícone. Talvez a chamassem de aberração, um monstro, uma górgona de carne. As possibilidades eram infinitas, e eu não arriscaria perder a única coisa que já amei.

“Um dia te levarei,” toquei em seu rosto. “Só não agora.” adormecemos.

Pela primeira vez em minha vida, o dinheiro que ganhei com meus quadros foi bastante. Nao precisei roubar nada para que eu e Erika pudéssemos comer naquele dia, tinha vendido todos os quadros. Isso nunca havia acontecido antes — um dia normal de vender arte na praça era repleto de pessoas rudes, reclamando dos meus preços, reclamando das minhas pinturas, me ignorando. Eu vendia, talvez, uma ou duas pequenas esculturas por semana. Naquele dia havia vendido tudo. Cheguei em casa sem arte alguma, apenas jantar e bolsos cheios, e Erika me abraçou quando me viu.

Quando contei que havia vendido todos os quadros, ela não ficou tão feliz por mim quanto eu esperava. Creio que por mais animada que estivesse com o fato das coisas estiverem dado certo, estava muito mais triste pelo fato de que não havia estado lá para ver.

“O que fez quando estive fora?” perguntei quando nos sentamos para comer. Mais uma vez não conseguia tirar os olhos dela. Lembrei-me de quando me inspirei para esculpi-la. Nunca fui uma mulher religiosa, — na verdade, tudo que me importava sobre a religião eram as imagens, os deuses e histórias que eu poderia transformar em arte — e nunca havia pensado em esculpir anjos. Normalmente os via como bebês gorduchos com asinhas nas costas, e não me agradava. Mas a imagem de Erika havia vindo para mim num sonho, e quando acordei, prontamente comecei a construí-la. Uma imagem daquelas não poderia viver para sempre em minha mente. E agora, lá estava ela, mastigando um pedaço de fruta, suas asas de anjo abertas atrás dela, olhando para mim com seus olhos angelicais.

“Tentei pintar,” ela respondeu, acenando com a cabeça em direção a tela semi rabiscada do outro lado do estúdio. “Mas achei muito difícil.”

“Posso te ensinar” ofereci, e ela sorriu. “O que mais?”

“Observei as pessoas,” ela olhou para a janela aberta. Meu sorriso levemente desapareceu em meu rosto.

“Elas não são tão interessantes assim. São bem rudes, na verdade.” eu disse.

“Você não é” Erika olhou para mim. Dei um beijo em sua bochecha. “A maioria das pessoas não vão te tratar bem. Você é um milagre, um sonho impossível que se tornou realidade. As pessoas as vezes tem os pés tão firmes no chão que preferem que seus sonhos continuem sendo sonhos.”

Ela levemente acenou a cabeça num ‘sim’ e sorriu para mim. Nós nos beijamos. Eu havia me apaixonado pela minha própria arte, e a minha própria arte havia criado vida e se apaixonado de volta por mim.

Quando adormecemos, fui visitada num sonho. Quando vi aquele grande borrão de luz, acho que devo ter tentado cobrir o meu rosto na vida real, como se a luz estivesse realmente diretamente em meus olhos.

“Espero que tenha gostado,” o borrão de luz desincorporado disse em meus sonhos, “de tudo que fiz por você.”

“O que?” respondi nos sonhos.

“A escultura. E os quadros vendidos.”

“Foi você?” perguntei, mesmo sem saber quem ‘você’ era. “Obrigada”

“Acho que pode me agradecer de outros modos,” a luz falou. “tenho um lugar guardado para você ao meu lado, onde poderá esculpir e pintar o que quiser, quando quiser, sem se preocupar com vender nada, com fazer dinheiro, com ter o bastante para comer e dormir.” eu estava completamente confusa. “Você terá tudo ao meu lado, basta vir comigo.”

“Abrigaria a mim e minha amada?”

“Sua amada?” a luz perguntou.

“Erika, é claro. A que você deu vida.”

Ele riu. “Seu amado serei eu.”

Me assustei. “Não poderia amar mais ninguém além dela.”

“Pode amar um Deus.” a luz disse, um certo tom de raiva crescendo em sua voz.

“Meu Deus é meu anjo, minha escultura, minha amante. Obrigada pelos presentes, mas não a trocaria por uma cadeira no Olimpo.” disse, e então imediatamente acordei. Ainda estava escuro lá fora e as ruas de Florença se estendiam vazias pela noite. Erika dormia pacificamente ao meu lado. Eu respirava ofegante, pensando na estranha conversa que tinha tido em meus próprios sonhos, e segurei a mão da mulher que dormia ao meu lado, apertada naquele colchão minúsculo. Adormeci novamente, tendo então sonhos perfeitamente ordinários.

Quando sai no outro dia com algumas pinturas e pequenas esculturas na mão e me acomodei na praça, não sabia o que esperar — a mesma sorte de ontem, ou a mesma sorte — ou azar — de sempre. O que veio, entretanto, foi pior. Os clientes que antes eram rudes e reclamavam de meus preços — que não eram altos de modo algum, mas apenas o bastante para me deixar comer e trabalhar por mais alguns dias — agora eram raivosos, indignados, como se o problema deles fosse pessoal comigo mesma. Como se eu houvesse feito algo de errado e tudo que eles precisavam era chegar até mim, xingar a mim e minha arte, quebrar esculturas e reclamar dos meus preços.

“Você deveria vender apenas aquilo que faz com talento,” um homem havia dito para mim. Ele parecia não saber onde ficavam os meus ouvidos, pois seus olhos estavam focados nos meus seios. “Como o corpo.”

Os que não faziam isso, que eram quase que a totalidade das pessoas que passavam por mim na praça, me ignoravam, não queriam um único vislumbre de minhas pinturas. Não ganhei um único centavo naquele dia, e, voltando para casa, lembrei-me do meu sonho e percebi — não era sorte ou azar, era a ira de um Deus.

Eu achava que minha tarde havia sido horrível, mas não estava preparada para o que me esperava em casa. Sangrando, sentada escorada na parede debaixo da janela, estava Erika, chorando, uma tesoura na mão e, no chão, ao seu lado, e não em suas costas, estavam suas asas.

“O que você fez?” disse, chegando perto dela.

“Eu não queria que me vissem como um monstro” ela disse. Eu tirei a tesoura de sua mão e olhei suas costas. Os tocos de o que deveriam ser suas asas estavam sangrando, manchando sua roupa branca. Eu sentei atrás dela e cobri as feridas com gaze, tentando fazer um curativo.

“Posso tentar costura-las de volta,” eu disse, e ela respondeu prontamente: “Não.”

Ficamos em silêncio por alguns minutos, eu a abraçando por trás, ela alisando com as mãos suas próprias asas jogadas no chão. “Posso ir com você amanhã?” ela quebrou o silêncio.

É claro que era sobre isso, sobre sair daquele quarto, andar pelas ruas ensolaradas de Florença, ver pessoas, falar com elas. Se as asas eram a única coisa que a impediam, era claro que ela as arrancaria fora. Eu não era o bastante para sua nova vida quase humana e ela queria mais. Eu queria ter conseguido convencê-la a tempo de que o melhor lugar que qualquer um de nós poderia estar era no dela — dentro desse quarto repleto de arte, de tintas, de mármore, longe dos comentários rudes, das pessoas mal-educadas, da gritaria, das guerras, das responsabilidades. Convencê-la de que a maioria dos dias eram iguais ao que eu havia tido hoje, apenas um pouco menos assustadores e maléficos, apenas um pouco menos pior para que me dessem esperança de dias melhores que nunca viriam. Queria eu mesma costurar as asas dela em mim para que pudéssemos trocar de vida, para que eu ficasse o dia inteiro nesse quarto enquanto ela que tem que lidar com o mundo lá fora, mas nunca a desejaria tanto mal quanto esse. Então simplesmente respondi, “Sim, claro.” e fui dormir.

Quando fomos até a praça na manhã seguinte, mal conseguia olhar para o rosto dela. Ela usava uma roupa que cobria suas costas, para que ninguém visse suas feridas, e sorria alegremente — um sorriso que nunca havia dado comigo, a euforia de alguém que estava finalmente dando um passo para fora de casa. Seus olhos brilhavam e ela observava cada detalhe, cada chafariz, cada estátua, cada pessoa, como uma criança que via o mundo pela primeira vez. Ela estava linda, iluminada pelo sol forte e com a alegria estampada em seu rosto, mas eu evitava observá-la a todo custo — evitava lembrar que as asas que eu havia esculpido a mão, as asas que haviam se mostrado para mim em sonhos, que faziam de minha amante um anjo — não estavam mais lá.

O dia estava parado. Não haviam clientes rudes, apenas desinteressados. Ninguém havia parado para observar minhas pinturas o dia inteiro, e Erika parecia nem perceber — ela passeava pela praça e conversava com todos, abria seus braços para o sol, jogava moedas nas fontes e alimentava os pombos. Sempre por perto, para que eu não a perdesse de vista — apesar de, mesmo querendo ignorar o sentimento, eu não quisesse vê-la. Não queria olhar para ela ou tê-la por perto.

Perto do pôr do sol, um homem começou a se aproximar de nós — sua pele era incrivelmente preta e a luz do sol dourado refletindo em sua pele parecia quase ouro. Eu não conseguia tirar meus olhos do homem e da luz que o rodeava, e pensei que parecia que ele havia acabado de sair dos aposentos do rei Midas. Ele chegou na minha frente e começou a observar os meus quadros.

“Gostou de algum?” perguntei.

Ele olhou para mim. “Já mudou de ideia?” disse, e eu sabia que já havia ouvido sua voz antes. Sua identidade parecia óbvia, agora que sabia quem era, e me indignei de não ter sabido assim que bati meus olhos nele.

“Apolo” disse. Ele sorriu.

“Já se arrepende de ter recusado a minha proposta?”

“Você não entende de modo algum o que é amor, entende?” provoquei, e imediatamente me arrependi. Se o dia anterior havia sido obra de sua ira, não poderia imaginar o que irritá-lo mais faria. Mas ele não pareceu irritado. O sorriso irônico em seu rosto apenas cresceu mais.

“Amor?” ele olhou em meus olhos, e então olhou para Erika, que brincava com um pombo ao nosso lado, desatenta a nossa conversa. “Mas você não a ama, ama? Não mais.” ele olhou para mim, e eu senti um profundo medo. “Não agora que ela não é mais o ser angelical que você a projetou para ser. Não sem suas asas.”

“Não é verdade,” eu disse, incerta de minhas próprias palavras. Ele riu.

“Te darei mais uma chance para ir comigo.” O Deus falou.

“Ficarei.” eu disse, imediatamente, orgulho transbordando em minhas palavras. Puro orgulho, pecado capital, que transforma anjos em demônios. Eu seria eternamente castigada pela minha húbris, como Atena havia feito com Aracne, como Agamemnon, como Jasão, e Adão e Eva. Aquele a quem os deuses querem destruir, primeiro deixam-no louco, e meu primeiro passo foi negar Apolo de seus desejos. Eu não queria continuar ali, vendendo — ou não — quadros, vivendo num quarto minúsculo com cheiro de tinta, jantando em chãos sujos de mármore, trabalhando todo dia para poder comer, cuidando de alguém — alguém que minha hubris havia me feito acreditar que amava. Mas eu havia dito não para o Deus, e as coisas agora apenas piorariam.

“Entendo.” Apolo disse, se afastando de mim. Ele olhou para o lado e disse, “Creio que aquele senhor está interessado em sua escultura.”

“Não estou vendendo escultura nenhuma,” disse, e então segui seus olhos — um senhor estava em pé na frente das obras que eu tinha em exibição, mas não olhava para os meus quadros — olhava para o monumento de pedra que se erguia ao lado deles. Na mesma posição em que eu havia a esculpido, mas sem suas asas, estava Erika. Se suas asas — suas grande asas de anjo que eu havia esculpido pena por pena, gigante em suas costas — estivessem lá, seria o mesmo que ver a mesma obra de mármore que eu havia construído em meu estúdio, pupilas vazias, pele de pedra.

Vendi a escultura por 20 moedas e gastei tudo em gesso. Voltei para o estúdio, cobri as asas com o material e as costurei em minhas próprias costas. Subi no pedestal no qual havia, quase que uma vida atrás, construído meu anjo. Cobri os meus pés com o gesso, e então minhas pernas, minhas coxas, meus braços, minha barriga. Antes que sufocasse com o material em meu rosto, rezei, por uma última vez, à Apolo.

“Se puder me perdoar,” pensei, enquanto o gesso se firmava em mim e cada centímetro de meu corpo virava pedra. “Leve-me contigo, e faça de mim ornamento de qualquer um de seus cômodos.”

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